POR FERNANDO MOLICA
Coordenador da Pastoral Católicos na Política no Estado, Dom Filippo Santoro, bispo de Petrópolis, afirma que a Igreja Católica não considerou suficiente a retirada, pelo governo, da proposta de legalização do aborto incluída no Plano Nacional de Direitos Humanos 3.
Não é comum que muitos setores da Igreja se posicionem de forma tão direta contra uma candidatura. O que gerou isto?
Setores da Igreja, entre os quais a Pastoral Católicos na Política criticaram muito o PNDH 3. Por quê?
Não é aceitável a visão da pessoa fechada ao transcendente, sem referência a critérios objetivos e determinada substancialmente pelo poder dominante e pelo Estado. A dignidade da pessoa, aberta ao mistério, é o fundamento dos Direitos Humanos e da convivência social de uma sociedade justa. No PNDH 3, a maneira como são tratados temas como a vida, família, educação, liberdade de consciência, de religião e de culto, de propriedade em sua função social e de imprensa, revela esta antropologia reduzida.
O governo assumiu o compromisso de retirar a legalização do aborto do PNDH 3. Não é suficiente?
Não é suficiente um remendo pelo qual a questão do aborto foi retirada do PNDH 3 e falaciosamente considerada “questão de saúde pública”. É necessário levar em conta a orientação de vastos setores da sociedade entre os quais muitos não são católicos e que têm um profundo senso religioso que influencia positivamente a vida social.
A religião, falo especificamente da fé católica, não serve só para a outra vida, mas dá sentido, beleza e dignidade a esta vida.
O Estado é leigo, mas não ateu; deve respeitar a religiosidade das pessoas e das agregações sociais. O PNDH 3 tem também aspectos positivos, mas como está, tende a alterar profundamente as bases da nossa sociedade.
Que pontos são essenciais para que um candidato à Presidência tenha o apoio unânime da Igreja?
São os pontos apresentados na nota da CNBB nacional, a Declaração Sobre o Momento Político Nacional, e especificamente no caso do Regional Leste 1, dos bispos do Estado do Rio de Janeiro: as Orientações e Critérios para as Próximas Eleições.
Em primeiro lugar, a defesa da dignidade da pessoa humana e da vida em todas as suas manifestações, desde a sua concepção até o seu fim natural com a morte. Rejeitamos veementemente toda forma de violência, bem como qualquer tipo de aborto, de exploração e mercado de menores, de eutanásia e qualquer forma de manipulação genética.
Em seguida, os bispos apresentam os outros critérios da defesa da família segundo o plano de Deus (rejeitando o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a adoção de crianças por casais homoafetivos, a legalização da prostituição, das drogas, do tráfico de seres humanos), a liberdade de educação, o princípio de solidariedade (a opção preferencial pelos pobres), de subsidiariedade (o Estado deve apoiar e não abafar a ação de grupos, associações e famílias que trabalham em vista do bem comum), a construção de uma cultura da paz em todos os níveis, particularmente na defesa da infância e da adolescência contra qualquer forma de violência.
A posição que o senhor e muitos setores da Igreja defendem não são unânimes. Setores da própria direção da CNBB deixaram isto claro. O senhor não teme que as manifestações contra uma das candidaturas – no caso, a da ex-ministra Dilma Rousseff – criem uma divisão na Igreja?
Nós, Bispos do Regional Leste 1 da CNBB, tomamos uma posição no início do processo eleitoral e agora a confirmamos, em sintonia com a nota da CNBB de 8 de outubro 2010, não indicando partidos ou candidatos, exortando os fiéis católicos a terem presentes critérios éticos. A mesma nota da CNBB nacional afirmava que “é direito – e mesmo, dever – de cada Bispo, em sua Diocese, orientar seus próprios diocesanos, sobretudo em assuntos que dizem respeito à fé e à moral cristã”.
O senhor e outros bispos brasileiros acabam de voltar de Roma. Os senhores estiveram com o Papa? As eleições brasileiras foram discutidas com ele? Há alguma preocupação de Roma com os eventuais resultados da eleição?
O encontro dos bispos do Estado do Rio com o Papa foi algo extraordinário. Na minha conversa particular, ele manifestou plena confiança no processo democrático do nosso País, que tem o maior número de católicos no mundo. Em nós, bispos, depois do encontro com o Santo Padre, cresceu o desejo de confirmar na fé e no espírito missionário os nossos fiéis, para que possam fazer coerentemente suas escolhas também em campo político, e dar a toda a nossa sociedade um suplemento de esperança.
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