sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Uma análise jurídica dos royalties

Para entendermos bem essa polêmica dos royalties, precisamos saber o que significa essa palavra e qual o seu conteúdo jurídico. Trata-se de uma palavra inglesa usada para caracterizar uma situação de um súdito que explorava, devidamente autorizado, um bem de propriedade da Coroa e que era obrigado a pagar ao Rei, uma determinada importância chamada de royaltie. Assim, essa palavra significa “aquilo que é devido ao rei”. Naquela época, os minerais do sub solo já eram considerados propriedade do Poder Público, no caso, o Reino da Inglaterra.

Esse instituto jurídico incorporou-se ao direito brasileiro, via direito internacional, e tem um caráter indenizatório, ou seja, o proprietário de um bem, público ou privado, tem o direito de autorizar um terceiro a explorá-lo, mediante o pagamento de uma importância previamente ajustada entre as partes. No direito privado, temos o exemplo das franquias que, no fundo, nada mais são do que um pagamento de royalties pelo usuário de uma marca ou patente de propriedade de outrem.

No direito público, a situação é idêntica. A Constituição Federal de 1988, em seu Art.20, estabeleceu que a União Federal é proprietária do sub-solo, isso significa que é a única dona do petróleo, dos minerais, dos mananciais de água e etc. Esse princípio é secular e praticamente todas as Constituições republicanas anteriores a atual, o adotaram.
Já o Art. 20, parágrafo primeiro da atual Constituição estabelece, entretanto, que a União Federal e seus órgãos de administração direta, Distrito Federal, Estados e Municípios, tem direito a uma participação nos resultados da exploração de petróleo ou recebam uma compensação financeira pelos danos que pode causar.

São, portanto, duas situações distintas, ou seja, participação nos resultados ou compensação financeira pelos danos que a atividade petrolífera poderá causar nos seus territórios ou plataforma continental, mar territorial ou zona econômica.

Ora, se somente a União Federal é proprietária do petróleo, por força da Constituição, significa que os Estados e Municípios, não são donos do bem, e assim sendo, entendemos, salvo melhor juízo, que somente a União Federal pode cobrar royalties pela exploração do mesmo pelas empresas de petróleo, no regime de concessão. Resumindo: Estados e Municípios produtores ou não, não tem direito de cobrar royalties, pela simples razão de que não são proprietários das jazidas petrolíferas.

Assim sendo, quando as petroleiras indenizam a União Federal, mediante o pagamento de royalties, elas se tornam possuidoras do petróleo. Isso, no regime de concessão, sendo irrelevante se o petróleo é extraido do pré ou do pós-sal.

A que título, então, a legislação ordinária, Lei nº 9478/97, estabeleceu um pagamento aos Estados e Municípios produtores? Temos aqui, seguramente, a segunda hipótese aventada no Art.20, parágrafo primeiro da Constituição, ou seja, um caso de reparação financeira pelos danos que a atividade petrolífera causa nos territórios e/ou mar territorial onde está instalada. Não se trata de royalties, portanto. É um princípio basilar de nosso direito pátrio, ou seja, todo aquele que causar dano a outrem, por dolo ou culpa, fica obrigado a repará-lo .

Frise-se ainda que é a União Federal quem indeniza os Estados e Municípios produtores, usando a receita dos royalties, e lhes repassa uma cota indenizatória, para que suportem o ônus dessa atividade. É de se registrar que o petróleo traz bônus, mas também muitos ônus. Podemos citar desastres ecológicos e também o crescimento populacional desordenado que exige vultosos investimentos públicos na infraestrutura municipal e estadual.

É uma aberração jurídica, portanto, ao nosso ver, que Estados e Municípios não produtores queiram receber uma reparação financeira por uma atividade que não existe em seus territórios ou plataforma continental, e não há a menor possibilidade de sofrerem qualquer dano.

Já no sistema de partilha, instituído pelo Governo Lula, e que revoga o regime de concessão, a situação se modifica, salvo melhor juízo, visto que, pelo que sabemos, nesse modelo, a União Federal continua dona do petróleo até a sua comercialização, e as petroleiras são apenas prestadoras de serviço (empreiteiras) que serão pagas com petróleo, quando da sua comercialização.

Por uma dedução lógica, o royaltie acaba, pois seria outra aberração jurídica, a União Federal cobrar royaltie de si mesma. Todavia, o direito dos Estados e Municípios produtores, de receberem uma reparação financeira continua, já que os possíveis danos provocados pela atividade em questão, também continuam. É preciso, portanto, que os legisladores regulamentem o sistema de partilha para incluir dispositivo que atenda a esse mandamento constitucional, inclusive criando uma nova fonte de receita para que a União Federal indenize os Estados e Municípios produtores.

Para finalizar, concluímos que os Estados e Municípios não produtores não têm direito a participação nos resultados da exploração do petróleo porque não são proprietários das jazidas e também não tem direito a reparação financeira porque não tem nenhuma exploração do mesmo em seu território, mar territorial, plataforma continental ou zona econômica, de acordo com o disposto no Art.20, parágrafo primeiro da Constituição Federal.

Como se vê, estamos diante de um problema muito complexo que exige a participação de um poder independente para julgar essa questão. Na República, esse poder está no Supremo Tribunal Federal. Com base no que for decidido por aquela Corte, o Congresso Nacional elaboraria uma lei regulando toda essa situação jurídica. A probabilidade de entendimento amigável, sem a intervenção do STF é nula, ao nosso ver, porque os interesses são muito antagônicos.

José Tadeu Dacol - Advogado

Fonte: Jornal aQui

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