domingo, 4 de abril de 2010

New York Times se desmente em seus ataques contra o Papa.

Reconstrução dos fatos oferecida por Riccardo Cascioli em “Avvenire”.

A documentação publicada pelo New York Times desmente a tese segunda a qual o cardeal Joseph Ratzinger não teria sido suficientemente enérgico ao gerenciar o caso de um sacerdote norte-americano culpado pelo abuso de várias crianças.

Essa é a conclusão do jornalista italiano Riccardo Cascioli, ao analisar o episódio, em um artigo do dia 26 de março no jornal Avvenire, que apresentamos a seguir.

Tudo começa no dia 15 de maio de 1974, quando um ex-estudante da St. John’s School para surdos apresenta uma denúncia sobre os abusos realizados sobre ele e sobre outros cinco meninos por Lawrence Murphy, entre 1964 e 1970, mas – segundo se publicou – após uma investigação, o juiz encarregado arquiva o caso. A diocese de Milwaukee, em contrapartida, afasta em seguida o padre Murphy, com uma permissão temporária por motivos de saúde (até novembro de 1974), que no entanto se converte em definitiva. Uma carta da diocese de Superior em 1980 explica que Murphy vive em Bounder Junction (Wisconsin), na casa de sua mãe, ainda que continuasse exercendo o ministério sacerdotal ajudando o pároco local.

Enquanto isso, não obstante, as denúncias junto à diocese de Milwaukee se multiplicam e, entre julho e dezembro de 1993, Murphy é submetido a quatro longos interrogatórios por responsáveis da arquidiocese, acompanhados por psicólogos especialistas em pedofilia. Surge daí um quadro clínico de “pedófilo típico”, em que se recomenda um tratamento psicológico para maníacos sexuais e também um acompanhamento pastoral/espiritual, ademais de uma restrição da atividade ministerial. Do informe dos interrogatórios se desprende que havia 29 denúncias de menores: Murphy admite “contatos” só com 19 das crianças implicadas. Dos documentos sucessivos, tem-se a demonstração de que a arquidiocese de Milwaukee prossegue suas investigações, tentado precisar a realidade e a magnitude dos fatos, e a 17 de julho de 1996, o bispo Rembert Weakland escreve então ao prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cardeal Joseph Ratzinger, pedindo uma luz sobre o caso de Murphy e sobre outro – não relacionado – de outro sacerdote, acusado de crimes sexuais e financeiros.

Dom Weakland faz referência à denúncia de 1974, e explica que só recentemente teve conhecimento do fato de que certos crimes sexuais ocorreram durante o sacramento da Confissão, pelo que havia encarregado oficialmente um sacerdote da diocese, James Connell, de realizar uma investigação em profundidade (o decreto é de dezembro de 1995).
Um obstáculo à verificação dos fatos – afirma Dom Weakland – procede da compreensível reticência dos meninos e da comunidade da St John’s School em fazer públicas as circunstâncias embaraçosas. Dom Weakland se dirige à Congregação para a Doutrina da Fé para pedir um esclarecimento sobre a jurisdição neste caso de “crime de solicitação” (cânon 1387) , e se é competência da diocese ou da Congregação.

Dos sucessivos documentos, parece que a carta não chegou nunca à mesa do cardeal Ratzinger e do então monsenhor Bertone, secretário da Congregação para a Doutrina da Fé. Em todo caso, diante da falta de uma resposta, a arquidiocese de Milwaukee seguiu adiante seu caminho e, a 10 de dezembro de 1996, informa a Murphy que no dia 22 de novembro tinha sido aberto um procedimento penal eclesiástico contra ele com um tribunal criado ad hoc. O pedido da acusação é a “expulsão de Murphy do estado clerical”.

O problema que se estabelece, no entanto, é o da prescrição dos crimes cometidos, pelo que, segundo a norma do direito canônico, não se poderia proceder à expulsão. Mas o arcebispo de Milwaukee tem intenção de conseguir uma revogação do cânon, tendo em conta a situação física e psicológica das vítimas. Sua intenção foi aceita depois por monsenhor Betone, na carta de 24 de março de 1997. No final de 1997, o processo passa à diocese de Superior, mas o presidente do tribunal continua sendo o mesmo de Milwaukee, Thomas Brundage.

Dos documentos apresentados pelo New York Times mostra-se claramente a intenção das autoridades eclesiásticas de Milwaukee e Superior de proceder da forma mais rápida possível para chegar a um ato de justiça e de reparação para as vítimas e a comunidade da St John’s School.

Enquanto isso, Murphy escreve uma carta ao cardeal Ratzinger (12 de janeiro de 1998), pedindo a anulação do processo contra ele, porque a Instrução de 1962 prevê, para começar a ação penal, um prazo de 30 dias desde o momento em que se apresenta a acusação. Murphy afirma, ademais, que – além de estar arrependido – está gravemente enfermo e vive retirado há 24 anos. Pede que ao menos não seja expulso do estado clerical.

A 6 de abril de 1998, monsenhor Bertone escreve a Dom Fliss, bispo de Superior, em nome da Congregação para a Doutrina da Fé, explicando que – após ter examinado atentamente o caso – não existe um prazo para a ação penal tal e como afirmava Murphy, por isso, o processo pode continuar, ainda que – acrescenta Bertone – há que ter em conta o artigo 1341 do Código de Direito Canônico, segundo o qual uma sanção penal deve ser aplicada só após se ter constatado que não seja “possível obter de modo suficiente a reparação do escândalo, o restabelecimento da justiça e a correção do culpado” com outro meios.

Dom Fliss responde a 13 de maio a monsenhor Bertone, afirmando que, conforme ao que indica a Congregação, é necessário um processo contra Murphy, tendo em conta a gravidade do escândalo e a grande dor infligida na comunidade católica da St John’ School.

Chega-se portanto a 30 de maio, quando no Vaticano há um encontro entre monsenhor Bertone, o subsecretário da Congregação para a Doutrina da Fé, Gianfranco Girotti, e os prelados norte-americanos afetados pela questão. Da ata do encontro se desprende que na Congregação há dúvidas sobre a possibilidade e a oportunidade do processo canônico, dada a dificuldade de reconstruir os fatos ocorridos 35 anos antes, sobretudo no que diz respeito ao crime no confessionário, e dado que não existem outras acusações de 1974 adiante. Bertone, portanto, como conclusão do encontro, resume as duas linhas fundamentais que aplicar: uma restrição territorial para o ministério sacerdotal (na prática Murphy deve ficar em Superior) e uma ação decidida para obter o arrependimento do sacerdote, incluída a ameaça de “expulsão do estado clerical”.

O bispo de Milwaukee escreve ainda a 19 de agosto a monsenhor Bertone para colocá-lo a par das medidas tomadas para levar a cabo as linhas indicadas pela Congregação, e informá-lo do fato de que sua diocese seguirá a cargo dos custos para apoiar as terapias às vítimas dos abusos sexuais.

A 21 de agosto, Murphy morre, encerrando definitivamente o caso.

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