terça-feira, 27 de julho de 2010

O segredo do professor Ratzinger‏.

Como leitura para os momentos de descanso, escolhi “Ratzinger professor”, de Gianni Valente. Um texto verdadeiramente interessante para conhecer o Papa Joseph Ratzinger em seus anos de juventude, e assim compreeender melhor seu pontificado hoje. Seria impossível sintetizar em um espaço tão reduzido toda a riqueza desta reconstrução da juventude e maturidade do homem que o Senhor Jesus escolheu como seu Vigário na terra para nosso tempo. Mas gostaria de destacar apenas dois pontos que evidenciam a coerência de Joseph Ratzinger, desde os tempos de sua juventude quando estudante e sacerdote até os dias de hoje, como Pontífice da Igreja universal.

Primeiramente:

A lectio magistralis proferida em 24 de junho de 1959, no início de sua carreira como docente na Universidade de Bonn, tinha por título O Deus da fé e o Deus dos filósofos. A “questão urgente” apresentada pelo jovem professor de 32 anos referia-se ao divórcio moderno entre fé e razão, entre uma religião confinada ao campo pessoal e privado, ínitimo e sentimental, e a busca racional que, desede Kant, renega toda possibilidade de conhecer ou ter acesso a Deus.
Citando São Tomás, Ratzinger afirma que é possível superar toda contraposição deletéria entre a linguagem da fé e a linguagem da razão. O Deus que gradualmente se manifesta no Antigo e no Novo Testamento coincide, ao menos em parte, com o “Deus dos filósofos”, isto é, com a concepção que os homens têm de Deus. O problema é de linguagem. Os Padres da Igreja fizeram uma notável síntese da fé bíblica e do espírito helênico. Do mesmo modo, escreve o jovem Raztinger, “se (hoje) é essencial, para a mensagem cristã, ser não uma doutrina esotérica em busca de iniciados, mas a mensagem de Deus dirigida a todos, então é essencial, para tal, traduzi-la também na linguagem comum da razão humana”. O jovem sacerdote e professor alemão não se permitia iludir. Em um artigo publicado em 1958, Ratzinger escreve que considerar a Europa um continente “predominantemente cristão” é um “erro estatístico”:

“Esta Europa, cristã no nome, é berço há mais de 400 anos de um novo paganismo, que cresce sem encontrar oposição no próprio coração da Igreja, e ameaça demoli-la de dentro”.

A Igreja Católica do pós-guerra parece ter se tornado “cada vez mais, e de uma maneira totalmente nova, Igreja de pagãos. Não mais, como em outros tempos, Igreja de pagãos tornados cristãos, mas sim a Igreja de pagãos que se dizem ainda cristãos, mas que na verdade se tornaram pagãos”.

O segundo ponto:

É a profundidade de penasmento aliada à clareza do professor Ratzinger ao ensinar teologia, que o torna muito popular entre os estudantes. Em tempos em que os “barões das cátedras” com frequência falavam em linguagem difícil e não se preocupavam em se fazer compreender pelos estudantes, Ratzinger introduzia uma nova maneira de lecionar: “Lia as aulas na cozinha para sua irmã Maria, pessoa inteligente mas que jamais havia estudado teologia. Se sua irmã manifestava aprovação, era sinal de que aula estava boa”, conta o biógrafo em seu livro.

E um estudante daquele tempo acrescenta:

“A sala estava sempre lotada, os estudantes o adoravam. Tinha uma linguagem bela e simples. A linguagem de um fiel. Ratzinger não fazia exibições de erudição acadêmica nem usava o tom oratório habitual da época. Expunha sua lições de modo claro, com uma linguagem de límpida simplicidade, mesmo ao abordar as questões mais complexas."

Muitos anos mais tarde, o próprio Ratzinger explicava o segredo do sucesso de suas aulas:

“Nunca tentei criar um sistema meu, uma teologia minha particular. Falando mais especificamente, trata-se simplesmente do fato de que eu me propunha a pensar com a Igreja, e isto significa, principalmente, com os grandes pensadores da fé”.

Os estudantes precebiam, através de suas lições, que não estavam apenas a receber noções de conhecimentos acadêmicos, mas que entravam em contato com algo realmente grande, com o âmago da fé cristã. Era este o segredo do jovem professor de teologia, que tanto atraía os estudantes.

Pe. Piero Gheddo - www.gheddopiero.it - Editor de Mondo e Missione e Italia Missionaria, é um dos fundadores da agência Asia News (1986). Como missionário, esteve em todos os continentes e é autor de mais de 80 livros. Foi diretor do Departamento Histórico do Pime em Roma e postulador de diversas causas de canonização. Hoje vive em Milão.

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